Acórdão nº 2965/11.8TAVNG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelELISA SALES
Data da Resolução09 de Janeiro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - RELATÓRIO No processo comum n.º 2965/11.8TAVNG da 1ª Secção da Vara de Competência Mista de Coimbra, após a realização da audiência de julgamento, foi proferido acórdão que decidiu: a) condenar o arguido A...

pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, com referência às Tabelas II-A e I-C anexas, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão; b) condenar o arguido B...

pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, com referência às Tabelas II-A e I-C anexas, na pena de 6 (seis) anos de prisão; c) absolver os arguidos C...

e D...

da prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01 d) declarar perdidos a favor do Estado, os 950 euros apreendidos ao arguido A.... e, o telemóvel e o veículo com a matrícula 6BB-K66 apreendidos ao arguido B....

*** Os arguidos B...

e A....

não se conformaram com a decisão proferida em 1ª instância, e dela interpuseram recurso, tendo extraído das respectivas motivações as seguintes conclusões: O arguido B...

: 1- A factualidade provada permite concluir que o arguido: "No dia 27.10.10 o arguido B... combinou com o arguido A.... entregar-lhe produto estupefaciente, que este lhe tinha solicitado, a troco do seu pagamento em dinheiro. Deslocou-se para o efeito a Coimbra. Aquando da detenção pelos inspectores da P.J, o arguido, B..., detinha, no interior do veículo de matrícula …, de que é proprietário, 1300 comprimidos de MDMA, com o peso líquido global de 31,171 gramas, que se encontravam colocadas no interior de uma embalagem de café Sical, quatro embalagens cilíndricas de cor preta que continham 38,202 gramas líquidas de MDMA; no interior de uma caixa preta para relógios, uma embalagem de MDMA com o peso líquido de 14,150 gramas e uma embalagem com 250 comprimidos de 2C-B, com o peso líquido global de 14,293 gramas," "Os arguidos B...e A...sabiam que não lhes era lícito receber, comprar, por à venda, vender, possuir, deter, adquirir, guardar, transportar, distribuir ou ceder MDMA, 2C-B e cannabis (folhas/sumidades), substâncias cuja natureza estupefaciente e características psicotrópicas bem conheciam e destinavam à venda a terceiros e quiseram fazê-lo, agindo da forma descrita.

Agiram os arguidos B...e A...voluntária, livre e conscientemente, em conjugação de esforços e vontades, como forma de melhor levarem a cabo tal actividade ilícita, sabendo as respectivas condutas proibidas e punidas por lei." 2- Face à factualidade provada de que o arguido detinha nas circunstâncias de tempo, modo e lugar, o produto estupefaciente apreendido, aliadas ao facto de à data da prática dos factos o arguido ser consumidor de produtos estupefacientes, nomeadamente "canábis e MDMA", sem terem sido apuradas quaisquer outras vendas, para além daquela que foi dada como provada e não chegou a ser concretizada face à intervenção do O.P.C (a forma como vinham acondicionados os produtos estupefacientes, no interior da viatura, num saco de café Sical, atrás do banco do pendura, e no interior de um saco transparente, e ao facto da transacção ser efectuada em plena via pública tendo o arguido utilizado o seu telemóvel, para o contacto como o adquirente dos referidos produtos), sem o suporte de qualquer tipo de organização, conjugado com o facto do acto ilícito se subsumir ao dia da detenção - interpretada à luz do espírito do sistema global, tendo-se presentes as implicações do princípio da proporcionalidade, tem de se concluir que se está perante uma actividade de tráfico de menor gravidade relativamente à ilicitude típica do Art. 25° do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro.

Na verdade, para além do produto estupefaciente que detinha, nada mais foi apreendido ao recorrente como ligado à actividade ilícita, designadamente objectos relacionados com o manuseamento do produto ou proventos da sua venda.

O acto ilícito apurado subsume-se ao dia da detenção, sendo certo que, o tribunal limitou-se a presumir que a venda do aludido produto estupefaciente em face da sua quantidade e natureza, permitiria aos arguidos A...e B...auferir lucros avultados.

Certo é, que não apurou qualquer outra venda por parte deste arguido, e o valor apurado desta, seriam 2.300 euros, o que não pode qualificar-se como sendo um montante elevado. Tanto mais que, o tribunal valorou as declarações prestadas pelo arguido, tendo este referido, que o lucro que iria obter na referida transacção seriam as 14 grs de MDMA , que estavam no interior de uma caixa.

Acresce ainda que, haveria que atender à qualidade dos produtos estupefacientes, apreendidos, Haxixe e MDMA, que, não são considerados "drogas duras", e pese embora seu consumo tenha efeitos nefastos para os seus utilizadores, são incomensuravelmente menores, aos provocados pelas chamadas "drogas duras", (cocaína e heroína), sendo também menores, os lucros auferidos com a sua venda. Tal circunstancialismo, deveria ser conjugado, com a sua situação actual, confessou os factos que lhe eram imputados, com relevo para a descoberta da verdade material.

O arguido assumiu todos os actos que praticou esclarecendo a participação de cada um dos co-arguidos nos presentes autos, a forma como obteve o estupefaciente apreendido, o preço de venda e o lucro que iria auferir.

Mostrou-se arrependido, e encontra-se abstinente do consumo de substâncias estupefacientes, está detido há cerca de 9 meses, e mantém no E.P. um comportamento isento de reparos, era primário e não tem processos pendentes. Factos que na perspectiva do recorrente constituem factores que mitigam a ilicitude do crime praticado.

Estes factores aliados, ao apoio familiar de que dispõe, concretizado nas visitas regulares dos seus familiares (pai e tio materno) e quando for restituído à liberdade será acolhido no seio familiar, dispondo de trabalho como servente de mecânico, na oficina de que é proprietário o tio materno, conforme atesta o contrato de trabalho junto aos autos, atenuam as exigências de prevenção especial.

Acresce ainda que, não são conhecidos quaisquer sentimentos de rejeição no meio onde reside, o que atenua as exigências de prevenção geral.

Pelo que, face ao aduzido, ao reduzido tempo que durou a actividade ilícita, um único dia, um único acto, à qualidade da droga transaccionada, ao lucro obtido e ao modus operandi utilizado, entende o arguido ser de integrar a sua conduta no dispositivo do artigo 25º do citado diploma.

Violou-se o disposto no artigo 25 do D.L 15/93 de 22-01.

3- A determinação da medida da pena parte do postulado de que as finalidades de aplicação das penas são, em primeiro lugar, a tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível, a reinserção do agente na comunidade, constituindo a medida da culpa o limite inultrapassável da medida da pena.

4- Na determinação concreta da medida da pena, o julgador atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele (art. 71º do C.P.), ou seja, as circunstâncias do complexo integral do facto que relevam para a prevenção e para a culpa.

5- Ponderada a globalidade da matéria factual provada, a conduta do arguido deveria ser subsumível à previsão dos disposto no artigo 25 n.º 1 do DL 15/93 de 22-01 6- Face aos critérios legais (arts 70º e 71º) o recorrente deveria ser punido atento às razões aduzidas na motivação do recurso ora interposto, com relevo para a sua idade e abandono da prática do ilícito, em medida não superior a 3 anos e 6 meses de prisão, pena esta que atento à sua condição pessoal, (primário, confessou os factos com relevância para a descoberta da verdade material, mostrou-se arrependido, dispor de apoio familiar e emprego garantido, ter uma imagem positiva no meio onde reside, ter mantido desde os 15 anos de idade hábitos de trabalho regulares, inicialmente em Portugal e aos 21 anos na Holanda onde desempenhou várias actividades, e demais circunstancialismo referido no relatório social, nomeadamente, a conclusão de que o mesmo em meio livre beneficiará de condições de suporte familiar, habitacional e laboral, que lhe facilitarão o seu processo ressocializador, processo para o qual B... está motivado e demonstra reunir condições/capacidades pessoais para assumir, deveria, a pena anteriormente sugerida ser suspensa por igual período.

Na verdade, como se refere no acórdão de 19-12-07, processo n.º 4088/07-3a, in CJSTJ 2007, TOMO 3, pág. 262, a medida constitui uma chamada à razão do condenado reforçada pelo facto de poder vir a executar no futuro, a prisão, para que não volte a incorrer em nova situação criminal, sendo também uma pena de correcção, de ajuda social e sócio-pedagógica.

Sendo certo que todo o juízo de prognose sobre um futuro comportamento comporta inevitavelmente algum risco, o mesmo será, porém mitigado com a imposição de sujeição a regras de conduta e a regime de prova; a suspensão da execução da pena, associada a tal sujeição e ao regime de prova, a efectivar de acordo com o que vier a ser determinado pelo I.R.S, contribuirá para a ressocialização do arguido.

Nesta perspectiva, crê-se ser fundada a esperança de que a socialização em liberdade possa ser lograda e não saírem defraudadas as expectativas comunitárias de reposição/estabilização da ordem jurídica, da confiança na validade da norma violada e no cumprimento do direito, nem será demasiado arriscado conceder uma oportunidade ao arguido, suspendendo a execução da pena, por haver condições para alcançar a concretização da socialização em liberdade, enfim, a finalidade reeducativa e pedagógica, que enforma o instituto, e que face ao disposto no n.º 5 do artigo 50º, terá a duração igual à da pena de prisão a contar do trânsito desta decisão.

A carência de continuação de prisão efectiva não se apresenta manifesta, sendo de conceder uma oportunidade ao arguido, constituindo a substituição da pena um sério aviso e uma solene...

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