Acórdão nº 317/07-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Abril de 2007

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução19 de Abril de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

29 Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Em 31.10.2005 N de G & V, C e M U, Lda, intentou nos Juízos Cíveis do Funchal uma acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra L A F de A e mulher S M L de F A.

Alega, em síntese, que no exercício da sua actividade prestou aos Réus trabalhos de carpintaria e marcenaria, destinados à residência daqueles, que em termos de mão de obra e material fornecido, ascenderam a € 11 684,00. Os demandados não negam a dívida, mas têm protelado o seu pagamento, com desculpas e evasivas de toda a ordem.

A A. termina pedindo a condenação dos Réus no pagamento da quantia de € 11 684,00, acrescida de juros legais à taxa de 4% ao ano, desde 28.7.2005, no valor de € 122,88, e juros vincendos até efectivo e integral reembolso.

A acompanhar a petição inicial a A. juntou cópia de uma factura, datada de 27.7.2005 e no valor de € 11 684,00.

Os Réus contestaram, admitindo que a A. lhes prestou os trabalhos invocados, pelo valor indicado, mas acrescentaram que a dívida está parcialmente paga, através de um primeiro pagamento, no valor de € 5 000,00, efectuado por meio de cheque datado de 31.3.2005 e de um segundo pagamento, no valor de € 5 000,00, efectuado em 27.7.2005 e que se encontra titulado por recibo de quitação, datado de 27.7.2005, emitido pelo sócio gerente da Autora. Afirmam dever à A. tão só a quantia de € 1 684,00 e recusam a obrigação do pagamento de juros, pois os Réus nunca haviam sido interpelados para pagar.

Os Réus terminam pedindo que a excepção peremptória do pagamento parcial do valor de € 10 000,00 seja julgada procedente e consequentemente os Réus sejam condenados a pagarem tão só a quantia em falta, no valor de € 1 684,00.

Com a contestação os Réus juntaram cópia do mencionado cheque e ainda o original do aludido recibo de quitação.

A A. respondeu à excepção, dizendo, em síntese, que apenas recebeu o valor do aludido cheque e que após muita insistência junto do Réu marido para obter o pagamento do restante, resolveu emitir e enviar aos Réus a factura documentada nos autos, acompanhada do recibo de quitação também junto, o qual diz respeito ao valor do cheque. Invoca o teor de várias mensagens de telemóvel, que alegadamente lhe foram enviadas pelo Réu marido, para demonstrar a veracidade do teor da sua resposta. Termina pedindo que os Réus sejam condenados em multa e indemnização a favor da Autora, como litigantes de má fé.

Procedeu-se a audiência preliminar, no decurso da qual o tribunal a quo seleccionou os factos assentes e elaborou base instrutória, com reclamação dos Réus, parcialmente atendida.

Realizou-se audiência de julgamento, com gravação dos depoimentos. A final, o tribunal respondeu à base instrutória, sem reclamações.

Oportunamente o tribunal proferiu sentença, cuja parte dispositiva tem o seguinte teor: "Pelo exposto, e nos termos dos preceitos legais supra referidos, julgo a presente acção procedente por provada e, em consequência, condeno os réus no pagamento à autora da quantia de 6 684,00, acrescida dos juros legais desde 28.7.2005 até integral pagamento, bem assim como condeno os réus como litigantes de má fé na multa mínima prevista no art.º 102º, al a) do C. Custas Judiciais e numa indemnização a favor da autora no montante de 150,00 (cento e cinquenta euros).

Custas pelos réus." Os Réus apelaram da sentença, tendo apresentado alegações em que formularam as seguintes conclusões:

  1. O Sr. juiz "a quo" errou na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa, encontrando-se a douta sentença "a quo" enferma de vícios que a tornam nula, nomeadamente em transcrições de mensagens de telemóvel e que foram retiradas da resposta à contestação, sem que haja demonstrado qual o número da sua proveniência, que o mesmo pertença aos Apelantes e quem as enviou.

  2. Com vista ao esclarecimento da proveniência das mesmas (mensagens), o Sr. juiz "a quo", conforme fls. 114 dos autos, deferiu o requerido pedido de esclarecimento à vodafone para que esta informasse, como informou, o Tribunal que é possível adulterar mensagens gravadas de e para a caixa de correio de um qualquer telemóvel, conforme consta nos três últimos parágrafos de fls. 124 e 125 dos autos.

  3. Na sequência de tal pedido de esclarecimento, o Sr. juiz "a quo", conforme fls. 109 e primeira parte de fls. 110 dos autos, também deferiu o pedido dos Apelantes para que a Apelada juntasse aos autos a transcrição das mensagens provenientes do telemóvel nº 96 65 18 646, sendo este o único de pertença do Apelante marido, desde o dia 04/07/2005 até ao dia 15/08/2005, o que não foi cumprido por aquela.

  4. Tais requerimentos, informações e o não cumprimento da referida transcrição, não foram objecto de qualquer exame crítico pelo meritíssimo juiz "a quo", quer na fundamentação da resposta à base instrutória, quer na douta sentença sob recurso, quando devia tê-lo sido, em violação do artigo 515º, n03 do artigo 6590 e 1ª parte da alínea d) do nº 1 do artigo 6680, todos do Código de Processo Civil.

  5. O Sr. juiz "a quo", no cumprimento do artigo 560º do Código de Processo Civil, interrogou os Apelantes sobre cada um dos factos que foram objecto do depoimento e deles não obteve qualquer confissão.

  6. Após ter requerido as instâncias que entendeu e de forma muito ruidosa, o mandatário da Apelada, por sua iniciativa, ditou a fantasiosa confissão que consta de fls. 103 e primeira parte de fls 104 dos autos, tendo o Sr. juiz "a quo" optado por reproduzi-la "ipsis verbis", incluindo os mesmos pontos e vírgulas, sem que haja cumprido com o previsto no n03 do artigo 563º do Código de Processo Civil, ou seja, não perguntou ao depoente se confirmava ou não a assentada.

  7. Tal redacção foi objecto de reclamação pelos Apelantes, conforme fls. 105 dos autos, tendo o Sr. juiz ‘‘a quo" indeferido a mesma, para, numa fuga para a frente, emendar o que aparentemente ignorava e, sem que haja lido ao depoente a assentada, ditou para a acta uma inexistente declaração do depoente marido.

  8. Como estamos perante um litisconsórcio necessário passivo, teria de existir, como não existiu, confissão de ambos os apelantes, nomeadamente da esposa.

  9. A existir, como não existiu, a aludida confissão, a mesma é inócua em termos de prova contra ambos os Apelantes, nos termos do n02 do artigo 353º do Código Civil e n02 do artigo 298º do Código de Processo Civil, o que não foi objecto de qualquer análise crítica pelo Sr. juiz "a quo", quer nos fundamentos à resposta da base instrutória, quer nos da sentença "a quo".

  10. Acresce a tudo o que se referiu, que a testemunha  M V M foi manipulada, com expressa oposição dos Apelantes, em plena audiência de discussão e julgamento, conforme fls. 108 e 109 dos autos, onde o mandaram ler, em voz alta, as mensagens constantes do telemóvel, enviadas não se sabe de onde, nem por quem, tudo em manifesta violação do nº 1 do artigo 260 e nº 1 e 4 do artigo 340, ambos da Constituição.

  11. O depoimento da referida testemunha  M é nulo e que consta do douto despacho de fls. 158 dos autos como fundamental para que o Sr. juiz "a quo" formasse a sua convicção na resposta à base instrutória, nos termos em que o fez, com influência decisiva no desfecho final da acção, o que torna a sentença "a quo" nula.

  12. Os Apelantes colocam, salvo diferente e melhor opinião, também sob censura, a sentença "a quo" pelo facto de terem sido condenados no pagamento da totalidade das custas judiciais.

  13. De facto, o valor da causa ficou definitivamente fixado por acordo tácito das partes e pelo não uso do poder de alterar o valor da causa pelo Sr. juiz "a quo", nos termos do artigo 315º do Código de Processo Civil.

  14. A Apelada, conforme consta da petição inicial, deduziu o pedido do pagamento da quantia de 11.806 Euros e 88 cêntimos, acrescido dos juros legais vincendos, até integral pagamento (fls. 2 dos autos), tendo o valor da causa ficado determinado no momento em que a acção foi proposta, nos termos do nº 1 do artigo 308° do Código de Processo Civil.

  15. Houve um decaimento da acção na quantia de 5.122 Euros e 88 cêntimos, tendo a Apelada ficado vencida nesta parte.

  16. Pelo referido, a douta sentença, ao não ter procedido à divisão das custas em função do decaimento, violou o nº 1 do artigo 3080; o artigo 315º e o nº 2 do artigo 446º, todos do Código de Processo Civil.

  17. O Sr. Juiz "a quo" equivocou-se ao ter decidido que os Apelantes litigaram de má fé e, por consequência, condenou-os a pagarem uma indemnização à parte contrária, eclipsando, por completo, todo o comportamento da Apelada ao longo de todo o processo.

  18. A Apelada começou por peticionar a quantia de 11.806,88 (onze mil oitocentos e seis euros e oitenta e oito cêntimos), tendo omitido, por completo, o cheque por si levantado e que se encontra datado de 31/03/2005, no valor de 5.000 (cinco mil) Euros, tendo deduzido uma pretensão cuja falta de fundamento era evidente, tudo demonstrativo da sua má fé.

  19. Acresce que a Apelada, sem qualquer causa, peticionou a quantia de 122 Euros e 88 cêntimos, a título de juros que, ao tempo, não haviam vencido (fls 1 verso dos autos), o que foi ignorado pelo Sr. juiz "a quo" na sua douta sentença, ou seja, deduziu uma pretensão cuja falta de fundamento era evidente, tudo demonstrativo da sua má fé.

  20. Salvo diferente e melhor opinião, os Apelantes nunca falsearam a verdade, nem impediram, por qualquer forma, que se faça justiça, tendo-se limitado a contestar a acção por excepção peremptória de pagamento parcial, uma vez que já haviam efectuado os indicados pagamentos e a se oporem à exigência pela Apelada dos juros inexistentes, no valor de 122 Euros e 88 cêntimos, pelo que não houve de sua parte má fé.

  21. Por outro lado, a matéria dos quesitos 7; 11; 12; 15; 16 e 22 da base instrutória devem ter-se por não escritos por serem juízos conclusivos e conterem valorações jurídicas não quesitáveis, tudo porque o Tribunal só tem de se pronunciar sobre factos, nos termos do n°4 do artigo 6460 e artigo...

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