Acórdão nº 2747/2006-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Julho de 2006

Magistrado ResponsávelTIBÉRIO SILVA
Data da Resolução12 de Julho de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:IA.

intentou contra B., ambos com os sinais dos autos, acção ordinária, alegando, em resumo, que: O A. foi vítima de um acidente de viação, em 27 de Janeiro de 1979.

Quando, no sentido Cascais-Lisboa, conduzia o seu automóvel ..-..-.., foi este violentamente embatido pelo veículo ..-..-.., conduzido por . S., que, na chamada curva do Mónaco, saiu da sua faixa rodagem.

Em consequência do acidente, o veículo do A. ficou destruído.

O A. sofreu múltiplos traumatismos, com imediata perda de conhecimento, ficando entre a vida e morte.

Com interesses em diversas actividades e empresas, teve de abandonar a sua vida profissional definitivamente, afastando-se do convívio de clientes e fornecedores, colegas de profissão e amizades do meio empresarial e comercial em que vivia.

Ficou num estado de desinteresse pela vida, tendo chegado a pensar suicidar-se, perante a incapacidade em que se via.

No ano de 1981, o A. contactou o R., advogado de profissão, para que o patrocinasse na acção de indemnização a que tinha direito, vindo a constituí-lo mandatário forense. Mas, a partir dessa data, não teve mais qualquer informação sobre o estado do processo.

Telefonou para o escritório do R., mas não conseguiu contactá-lo.

Decorridos anos sem qualquer informação, o A. decidiu escrever-lhe várias cartas, sem resposta.

Em 1989, deslocou-se ao Tribunal de Oeiras e veio a saber que o processo estava arquivado, em virtude da negligência do seu mandatário em requerer o prosseguimento dos autos quanto ao pedido cível, em conformidade com o disposto na Lei nº 3/81 de 13/03 (Lei da Amnistia).

Tentou, de novo, sem êxito, entrar em contacto com o seu advogado.

Participou os factos à Ordem dos Advogados, mas veio a ser considerada extinta qualquer infracção do R. nos termos da nova Lei da Amnistia (Lei nº 15/94 de 11/05).

Não tendo o R. renunciado ao mandato, é responsável pelo seu cumprimento integral e pelos danos que a sua eventual negligência no cumprimento causou ao mandante/A.

É evidente que a negligência do R. em promover o prosseguimento dos autos quanto ao pedido cível foi um acto culposo que causou prejuízo ao A.

Termina, pedindo que o R. seja condenado a pagar ao A., a título de danos não patrimoniais, a quantia de Esc. 20.000.000$00 (vinte milhões de escudos).

Contestou o R., alegando, em síntese, que: Cumpriu integralmente o mandato que lhe tinha sido conferido, apresentando queixa-crime e deduzindo pedido cível, nos termos solicitados pelo A.

Em finais de Janeiro de 1983, o R. tomou conhecimento, por informação do Sr. Solicitador J.P., de que a queixa-crime tinha sido arquivada e o pedido cível tinha sido indeferido.

De imediato, contactou o A. e deu-lhe a conhecer estes factos.

O A. manifestou-lhe, então, vontade de apresentar novo pedido cível, concordando o R. em tratar do assunto.

Porque se tratava de uma nova acção judicial, para a qual seria necessário promover o pagamento de preparos e com a qual iria ter bastante trabalho, o R. solicitou ao A. que lhe entregasse uma procuração forense e determinada quantia a título de provisão para despesas e honorários.

Apesar dessa solicitação, o A. nunca entregou à R. a procuração e a provisão.

No decurso do processo-crime o A. sempre teve as informações que lhe solicitou e, findo o mesmo, foram-lhe explicadas pelo R. as razões do arquivamento e a forma como deveria agir para intentar nova acção, desta vez cível.

Só por culpa exclusiva do A. é que a acção cível não deu entrada.

O A. nada mandou e nada disse ao R., que, face à ausência de notícias daquele, se convenceu de que teria escolhido novo advogado para o representar.

Prosseguindo os autos, foi proferido despacho saneador e realizou-se a audiência de discussão e julgamento.

Foi proferida sentença, na qual se condenou o R. a pagar ao A. 25.000 €, bem como o montante do valor prejuízo que este liquidar a título de dano material.

Inconformado com esta decisão, dela recorreu o R., concluindo as suas alegações pela seguinte forma: «I- Cabia ao A. fazer prova de que o R. não praticou os actos solicitados ou que o fez de forma deficiente, o que não foi feito.

  1. Desta forma não pode resultar a alegada inversão do ónus da prova e a afirmação que o R. actuou de forma culposa.

III- Após lhe ter sido comunicado o resultado da demanda o A. esteve 5 anos sem contactar o R..

IV- Nos termos dos artigos 1163° e 1167° do CC o silêncio do A. durante 5 anos, após a comunicação do estado do mandato, tem que valer como aprovação da conduta do R..

V- Para que o A. pudesse ser indemnizado pelos danos decorrentes do alegado incumprimento do mandato necessário seria que o A. alegasse e provasse, em primeiro lugar, que o acidente dos autos ocorreu por culpa de terceiros e que por esse facto teria direito a uma qualquer compensação.

VI- O A. não logrou fazer tal prova.

VII- A douta sentença confunde o sofrimento físico e psicológico que o A. terá sofrido como consequência do acidente com o sofrimento que o A. alegadamente terá tido como consequência de qualquer omissão do R..

VIII- Só este dano moral foi pedido pelo A. e quanto ao mesmo nenhuma prova foi feita. Nem quanto à existência do mesmo nem quanto ao seu valor.

IX- Mesmo que se considere ter havido qualquer violação do mandato conferido, não logrou o A. fazer prova que tal violação lhe tivesse causado qualquer prejuízo.

X- A verba fixada como compensação por danos morais é infundada e exagerada.

X- Não se conhece o grau e a duração do alegado sofrimento.

XI- Cabia ao A. ser célere na propositura da presente acção.

XII- Não é possível deixar para liquidação o valor do prejuízo sofrido a título de danos materiais uma vez a liquidação em execução de sentença só é possível quando o autor desconhece as consequências do facto ilícito.

XIII- A douta sentença violou o disposto nos artigos 342°, 1163° e 1167° e do CC, o princípio do caso julgado, os artgs° 264°, 661° e 664° do CPC.».

Termina, dizendo que deve ser dado provimento ao presente recurso e a douta sentença recorrida revogada.

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