Acórdão nº 942/01.6TAPBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 30 de Maio de 2007
Magistrado Responsável | ALICE SANTOS |
Data da Resolução | 30 de Maio de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal.
*** No processo Comum Singular nº 942/01.6TAPBL.C1, após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que: - Condenou o arguido A...
pela prática de um crime de desacatamento ou recusa de decisão do tribunal, p. e p. no art. 13º da lei nº 34/87, de 16/07 por referência ao art 14º, nº 1 do CPenal, na pena de 5 ( cinco) meses de prisão que se substitui por 150 dias de multa à taxa diária de € 15.
*** Desta sentença interpôs recurso o arguido, A....
São do seguinte teor as conclusões, formuladas na motivação do recurso, interposto pelo arguido: a) estando todas as declarações prestadas em sede de julgamento reduzidas a gravação e a escrito, está o Tribunal da Relação em condições de poder conhecer de facto, face ao disposto no artº 428º do CPPenal; b) consequentemente pode o presente recurso ter por fundamento quaisquer questões de que pudesse conhecer a decisão do Tribunal "a quo", face ao disposto no artº 410º do CPPenal; c) permitindo a lei todos os meios de prova, a não apensação temporária aos autos da Acção Cível, impediu o arguido de se defender convenientemente, prejudicando assim o seu legítimo direito à defesa; d) o artº 48º da Lei 34/87 de 16 de Junho estabelece que o direito à indemnização prescreve nos mesmos prazos do procedimento criminal e não havendo no caso dos autos, prazos especiais para instauração do procedimento criminal, o crime encontra-se prescrito, dado que o Ministério Público teve conhecimento dos factos a 10 de Novembro de 2000 e só anos depois - e tinha seis meses para o fazer - actuou contra o arguido; e) o artº 13º da Lei 34/87 de 16 de visa apenas os actos passíveis de sanção criminal cometidos pelos detentores de cargos políticos no exercício das suas funções políticas, e nada na lei impede que as partes se socorram ou tenham de se socorrer de execuções para prestação de facto no decurso de processos cíveis; f) não integra o crime previsto no artº 13º da Lei 34/87 de 16 de Junho, a actuação de um Presidente de Junta de Freguesia, sempre que está em causa uma sentença transitada em julgado num processo cível contra a respectiva Junta de Freguesia; g) dada a prova produzida em sede de julgamento, o arguido A... deveria ter sido absolvido, pois a decisão viola flagrantemente o disposto no artº 410°, 1 e 2 do CPPenal; h) há manifesto erro de julgamento da matéria de facto e erro notório na apreciação da prova, bem como contradição insanável entre a fundamentação e a decisão; i) Quando assim se não entenda deveria quando muito ser a pena suspensa, nos termos do disposto no artº 50° do CPenal.
***** Nestes termos e nos melhores de direito deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença e proferindo-se Acórdão que absolva o arguido A... pela prática do crime de que foi acusado.
E assim se decidindo, praticarão V.Exa a habitual JUSTIÇA.
O recurso foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito suspensivo.
Respondeu o Digno Procurador Adjunto, manifestando-se pela improcedência do recurso, defendendo a manutenção da decisão recorrida.
Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto, emitiu parecer manifestando-se pela improcedência do recurso.
xxx Colhidos os vistos legais e efectuada a audiência, cumpre agora decidir.
O recurso abrange matéria de direito e de facto uma vez que as declarações prestadas encontram-se documentadas.
Da discussão da causa resultaram provados os factos seguintes constantes da decisão recorrida: 1. Por sentença proferida em 24.06.94, nos autos de acção com processo comum, na forma sumária, que correu os seus termos sob o n.º ..../92, 3.ª secção – 1.º Juízo, Tribunal Judicial de Pombal, e transitada em julgado a 15.07.94, foi a Junta de Freguesia de XX...
condenada a “reconhecer que os AA. são donos do prédio rústico sito em lugar da Tojeira, freguesia de XX..., inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo 1.772, confrontando do norte e sul com caminho publico, nascente com Alberto Gaspar Botas e poente com Daniel Lopes e outros, e a restituir aos AA. uma área do imóvel acima referido, livre e desocupada, área a liquidar em execução de sentença”.
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Na referida acção figuravam como AA.
B...
e mulher, C...
e, por sentença de 21.03.97, proferida em sede de execução para liquidação de sentença, e que transitou em julgado a 07.05.97, foi a Junta de Freguesia de XX... condenada a “restituir aos AA. uma área de 295 m2 do prédio destes, inscrito na matriz da freguesia de XX..., sob o artigo 1.712, com as dimensões e configuração constante do croqui de fls.25 dos presentes autos”.
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A junta de Freguesia de XX... foi notificada do teor desta sentença, na pessoa do respectivo mandatário, porém não restituiu aos então AA. a parcela de terreno acima identificada, tal como tinha sido condenada.
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Sob sua proposta, foi a referida parcela de terreno revestida com asfalto pela Câmara Municipal de Pombal.
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Na sequência disso, intentaram os AA. a respectiva execução, com vista à entrega da parcela de terreno, tendo a mesma sido entregue aos AA., então exequentes, em 05.06.98.
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Porém, uma vez que a referida parcela continuava revestida com o asfalto, fazendo parte de uma estrada, B... e mulher intentaram a execução para prestação de facto, que correu os seus termos sob o n.º897/99, do 1.º Juízo, do Tribunal Judicial de Pombal.
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Por despacho de 02.02.00, e que transitou em julgado em 21.02.00, foi a Junta de Freguesia de XX... notificada para: “que no prazo de 20 dias retire da parcela restituída o piso asfáltico e reponha o prédio no estado em que estava antes de o ocupar”.
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Nem no referido prazo, nem posteriormente, a Junta de Freguesia de XX... retirou o piso asfáltico da referida parcela de terreno.
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O arguido foi o Presidente da Junta de Freguesia de XX... desde Janeiro de 1994 até às últimas eleições autárquicas de Outubro de 2005.
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Bem sabia que nessa qualidade é o representante da Junta de Freguesia, cabendo-lhe, entre outras funções, acatar e executar as decisões dos tribunais relativas a acções em que a Junta de Freguesia de XX... intervenha.
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Apesar de saber que a Junta de Freguesia de XX... foi condenada a restituir aquela parcela de terreno; que a posse da mesma foi judicialmente entregue aos então AA.; e que a Junta de Freguesia foi notificada para em 20 dias retirar o piso asfáltico, tudo por sentenças e despachos judiciais, transitados em julgado e regularmente notificados, o arguido não acatou, nem executou tais decisões, bem sabendo que a tal estava obrigado, enquanto presidente da Junta de Freguesia de XX....
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O arguido agiu sempre com o propósito de manter no local a via asfaltada que reputava de muito importante para a população da freguesia, muito embora sabendo que dessa forma, necessariamente inviabilizava a efectiva entrega da parcela de terreno acima referida 13. Agiu livre, consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
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O Dr.
D...
encontrava-se mandatado pela Junta de Freguesia para negociar a aquisição da parcela de terreno em litígio.
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O arguido conhecendo as mencionadas negociações aguardou, sempre, que as mesmas fossem concluídas.
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O arguido nunca chegou a acordo quanto ao montante a pagar, dadas as diferenças existentes entre as quantias por si propostas e as reivindicadas pelo ofendido.
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O arguido chegou a equacionar em data não precisada a instauração de um processo expropriativo tendente à aquisição do mencionado prédio.
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A Junta de Freguesia de XX... deliberou nas reuniões de 16 de Janeiro de 2003 e 28 de Fevereiro, desse ano, que se evitasse a destruição da estrada em virtude dos interesses públicos em causa.
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O arguido é uma pessoa prestigiada e respeitada junto da população de XX... e um autarca dedicado à função pública.
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Foi condenado a 12.1.2001, pela prática a 26.10.2000 de um crime de dano, na pena de 140 dias de multa à taxa diária de 5€.
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É casado e vive com a esposa, que é doméstica, em casa própria.
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É reformado e aufere mensalmente, a título de pensões sociais, a quantia de € 225,00 da Segurança Social Francesa e € 500,00 da Segurança Social Portuguesa.
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Possui rendimentos imobiliários mensais no valor de € 1.500,00, aproximadamente.
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Entretanto a parcela de terreno objecto das acções supra mencionadas foi já entregue ao seu proprietário.
*** Em julgamento não lograram provar-se outros factos para além dos que, como tal supra se consignaram, designadamente quaisquer outros que estejam em oposição com os considerados assentes, que o arguido não tenha tido qualquer intervenção nos actos ofensivos da propriedade do ofendido, que a remoção da massa asfáltica nunca poderia ser feita pela Freguesia de XX... que não tinha à sua disposição meios técnicos para o fazer, mas, antes à Câmara...
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