Acórdão nº 142/09.7T3ETR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Abril de 2011

Magistrado ResponsávelALICE SANTOS
Data da Resolução27 de Abril de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

No processo supra identificado, após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que condenou a arguida, ON..., pela prática de: - um crime de injúrias, p. e p. pelo art 181, nº 1 do CPenal, na pena de 100 (cem) dias de multa, à taxa diária de € 5.50.

- dois crimes de difamação, p. e p. pelo art 180, do CPenal, na pena de 140 (cento e quarenta) dias de multa, à taxa diária de € 5.50, por cada crime.

- um crime de ameaças, p. e p. pelo art 153, nº 1 do CPenal, na pena de 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de € 5.50.

- Em cúmulo condenou a arguida na pena única de 320 (trezentos e vinte) dias de multa à taxa diária de € 5.50.

Julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por AP…, por si e na qualidade de representante legal de seus filhos menores, SD… e OS..., condenando ON... a pagar à demandante AP… uma indemnização no valor de € 500,00 (quinhentos euros), a título de danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora à taxa legal, desde a data da notificação do pedido de indemnização civil até integral pagamento.

Desta sentença interpôs recurso a arguida ON....

São do seguinte teor as conclusões, formuladas na motivação do recurso, interposto pelo arguido: 1- "4- A assistente teria, há 15 dias atrás, cortado o cabelo à NN...; 5- De seguida, a arguida deixou a filha em casa, fechando a porta à chave, e abeirou-se do automóvel em cujo interior estavam a assistente e seu companheiro e, com violência, deu vários murros na porta do vidro do condutor e, dirigindo-se à assistente disse, em altos berros, em tom agressivo e repetidamente" filha da puta, cortaste o cabelo à minha filha, sua puta, eu mato-te, sua filha da puta e espicaço-te toda"; 6- A arguida só parou quando um dos agentes policiais ali presentes interveio, levando-a para a porta de sua casa. ; 7- E quando o Sr. Agente BG..., depois de ter chamado pela arguida e esta ter aberto a porta de entrada, mas sem sair do espaço interior da habitação, lhe ter pedido que fosse buscar a NN... para se entregue ao pai, em vista, a arguida recusou-se novamente a fazê-lo e afirmou, em altos berros: " A minha filha não vai com essas pessoas que eu não deixo, cortaram-lhe o cabelo e ela não quer ir com eles, os filhos dela violaram a minha filha e eles há dias deixaram-na sozinha num café" 2- Das declarações da testemunha IC..., cujo excerto transcrito deixa supra. E tal como consta da douta motivação a fls (…) e do que referiu a assistente ON... que a arguida saiu de casa e se dirigiu ao veículo no interior do qual se encontrava a assistente e começou a dar murros no mesmo com violência ao mesmo tempo que lhe chamava “puta” e “filha da puta” e lhe dizia que a matava e a espicaçava toda, tendo parado com tal comportamento apenas quando houve intervenção de um dos agentes presentes no local.

3- Ainda segundo a mesma douta fundamentação a propósito do depoimento da testemunha IC…, de cujo depoimento se deixa um excerto da transcrição supra pode ler-se, que, relatou esta testemunha a recusa da entrega da menor, alegando inicialmente que esta se encontrava doente e que a dada altura a arguida sai de casa e dirige-se ao veículo onde se encontrava o pai da menor e assistente, sua companheira, começando a bater na referida viatura e dirigir insultos a assistente acusando-a de ter cortado o cabelo à filha.

4- Dos excertos acima transcritos, bem como da integral audição do depoimento prestado por esta testemunha, poderemos verificar que o mesmo infirma o depoimento prestado pela assistente e não o corrobora, pelo contrário. Aliás o próprio BG... tem versão diferente para o sucedido, quando no seu depoimento afirma que quando chegou ao local em nenhuma circunstância ouvir quaisquer injúrias ou ameaças dirigidas à assistente – as mesmas teriam ocorrido em momento anterior à sua chegada, tal como confirma o seu colega VV.... Tal como resulta das declarações da testemunha BG... e VV... que se deixaram supra transcritas.

5- Esta testemunha, não presenciou as injúrias, nem as ameaças, chegou depois, tal como o seu colega, afirma que o seu colega IC... foi quem assistiu às injúrias e ameaças, mas este conforme vimos do seu depoimento, não assistiu, recorda-se de uma conversa, fora do carro, do seu teor genérico, mas quem assistiu, ouviu e retirou a arguida do lugar terá sido o G..., que afinal chegou depois.

6- Tal como resulta do depoimento da testemunha VV..., pelos vistos, os agentes (no plural, pelo menos dois) agarraram a arguida, depois de esta ter batido no vidro dom carro e quase ter partido, enquanto insultava e ameaçava a assistente. Ora não podemos deixar de convir, ser esta, uma versão bem diferente daquela que trazem outros intervenientes, nomeadamente a testemunha IC.... Atente-se, que ao contrário do que sustenta o tribunal, os murros terão sido desferidos, na versão da assistente, no vidro da parte da frente da viatura, em frente ao pendura, e não no vidro lateral.

7- Resulta do acervo destes depoimentos que se encontra mal julgada a matéria de facto dada como assente nos arts 4,5,6 e 7 pelo que deve ser alterada e considerada não provada.

8- Depoimento da testemunha G... supra transcrito e tal como se alcança deste testemunho cujo excerto se transcreve, é que as expressões eventualmente proferidas pela arguida, de que os filhos da assistente terão violado a sua filha menor é que as mesmas não apresentaram qualquer credibilidade. Logo desprovidas de qualquer credibilidade,, não evidenciam ter sido proferidas com dolo, nem sequer dolo eventual, não preenchendo assim o tipo.

9- A Constituição da República estabelece no seu art. 32º, nº 1 uma cláusula geral de garantia a conferir ao arguido, instituindo que “o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso", especificando no seu n.º 2 em que consistem essas mesmas garantias.

10- Uma delas é o direito de presença do arguido na audiência de julgamento, que apenas pode ser afastado em casos excepcionais.

Por sua vez, no art. 20º nº 4 da Constituição também se assegura que "Todos têm direito a que uma causa em que intervenham sejam objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo".

11- A noção de processo equitativo tem igualmente consagração na Convenção Europeia dos Direitos Humanos [C.E.D.H], através do seu art. 6.º, segundo o qual 12- No âmbito do processo penal, o acusado deve dispor de um processo equitativo, o só é possível se lhe forem conferidas as devidas oportunidades para o mesmo se poder defender, não o colocando, de forma directa ou indirecta, numa posição de desvantagem face aos seus oponentes.

13- O preceituado no art. 118.º, do Código de Processo Penal, é expresso, por sua vez, em cominar no seu n.º 1 que "A violação ou a inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei", logo se dizendo no subsequente n.º 2 que "Nos casos em que a lei não cominar nulidade, o acto ilegal é irregular". Resulta do art. 119.º al. c), que "A ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência", é uma nulidade que assume natureza insanável.

14-Trata-se de resto de um dos seus direitos processuais gerais, tal como decorre do art. 61º, nº 1, al a), onde se diz que “o arguido goza em especial, em qualquer fase do processo e salvas as excepções da lei, dos direitos de:Estar presente aos actos processuais que directamente lhe disserem respeito”.

15- O legislador, com a lei Constitucional nº 1/97 através do seu art. 15.º, a aditar o já referido nº 6 ao artº 32º da C. Rep, preceituando que “A lei define os casos em que assegurados os direitos de defesa, pode ser dispensada a presença do arguido ou acusado em julgamento".

16- Uma dessas situações em que se permite o julgamento na ausência do arguido é, segundo o citado art. 333.º, n.º 1, quando o mesmo" regularmente notificado não estiver presente na hora designada para o início da audiência," sendo certo que "o presidente toma as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência, e a audiência só é adiada se o tribunal considerar que é absolutamente indispensável para a descoberta verdade material a sua presença desde o início da audiência".

17- No caso em apreço como se pode constatar da acta da audiência de julgamento o tribunal lia quo" não tomou quaisquer providências para que o arguido fosse presente a julgamento, antes proferindo despacho no sentido de prosseguir a audiência, mesmo estando designada uma segunda data, e tendo a arguida comunicado estar impedida de comparecer na primeira data por motivo de doença.

Afigura-se-nos que para se assegurar um processe justo e equitativo devemos deixar esse ónus de convocação ou requisição aos tribunais e aos serviços de justiça, porquanto os meios materiais ao seu dispor são, em regras, superiores àqueles de que um normalmente arguido dispõe.

18- Nesta conformidade e no caso da arguida, depois de ter sido notificada da data da audiência de julgamento, e não comparece deve o Tribunal indagar dessa situação, e agindo em conformidade, havendo urna segunda data já marcada, onde presumivelmente a arguida estaria presente realizar a audiência apenas nessa data. Não o tendo feito, foi indevidamente preterida a presença do arguido na audiência de julgamento, o que gera uma nulidade insanável, face ao disposto no art. 119.º, al. c) do CPP.

Foram violados o artº 32º da CRP, 119 al c) do CPP, 118 do CPP, 359 do CPP, 379º do CPP, 410 nº 2 al a) do CPP.

O recurso foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos, sem efeito suspensivo.

Respondeu o Digno Procurador Adjunto, manifestando-se pela improcedência do recurso.

Nesta instância o Exmº...

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