Acórdão nº 10878/2005-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Fevereiro de 2006
Magistrado Responsável | PIMENTEL MARCOS |
Data da Resolução | 14 de Fevereiro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.
"V..." intentou a presente acção com processo ordinário, contra "C..,", pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe, a título de indemnização de clientela, uma quantia de 3.900.000$00, acrescida de juros, à taxa legal dos juros comerciais, vencidos desde a citação e até integral pagamento.
Para tanto alega, em síntese: ter celebrado um contrato com a "E...".", em que tomou a actividade de revenda de combustíveis e lubrificantes, tendo-se, para o efeito, obrigado a pagar os custos de licenças e taxas necessárias à exploração do posto, bem como todos os custos de exploração deste, nomeadamente os referentes a despesas com pessoal, segurança, energia, água, aferição de bombas, cabendo à "E..." o fornecimento exclusivo dos combustíveis e lubrificantes por ela comercializados; ter a A. obtido as licenças, contratado trabalhadores, outorgado o contrato de seguro, divulgado a sua abertura na região e iniciado um conjunto de obras e instalação de equipamentos no posto de abastecimento, cuja exploração foi iniciada em 01.94.96; ter explorado, no prédio onde está instalado o posto de abastecimento, uma boutique e um snack bar; ter organizado todos estes factores de produção e pago, por isso, taxas de exploração à "E..."; ter angariado, entre 1.4.1996 e 31.3.1999, para o aludido posto de abastecimento, várias centenas de clientes; ter a ré enviado à autora, em 13.08.1998, sob registo e com aviso de recepção, uma carta em que denunciava o contrato celebrado, com efeitos a partir de 31.09.1999, altura em que a A. deixou de explorar o posto de abastecimento de combustíveis; ter a clientela desse posto de abastecimento sido angariada ex novo pela Autora, clientela que continua a abastecer-se naquele posto; ter a Autora deixado de receber, após a cessação do contrato, qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos com esses clientes; ter a boa imagem que o estabelecimento hoje desfruta ficado a dever-se ao investimento da Autora e ao tratamento que esta, entre 1.4.1996 e 31.3.1999, sempre dispensou aos seus clientes; ter a Autora, durante esse período, recebido comissões no total de 11.733.556$00, limite que, de acordo a média anual estabelecível, aparece cifrado, para efeito da indemnização de clientela, em 3.911.185$00.
A ré contestou, pedindo a improcedência total da acção e a consequente absolvição do pedido, assim como a condenação da A. como litigante de má fé.
Invocou, para tanto, que: não foi celebrado qualquer contrato de agência; a concessão do aludido posto de combustível foi feita nos termos a celebrar posteriormente entre a "E..." e "V...", o que efectivamente veio a acontecer; o contrato celebrado entre "E:::" e a Autora, através do qual esta se obrigou a fazer a exploração do posto de abastecimento de combustíveis por sua exclusiva conta e risco, é um contrato misto de cessão de exploração de abastecimento, de compra e venda de combustíveis e lubrificantes e de franquia quanto à marca "E..."; a Autora não auferiu quaisquer comissões da R. e/ou da "E..." a denúncia do contrato não dá lugar a qualquer indemnização.
**Foi proferido despacho a saneador.
Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento e a matéria controvertida foi julgada nos termos do despacho de fls. 213 e segs., que não foi objecto de reclamação.
Seguidamente foi proferida a competente sentença julgando-se a acção parcialmente procedente, por provada e, em consequência, condenando-se a ré a pagar à autora a quantia de 9.975,96 euros, acrescida dos juros de mora, à taxa de juro comercial, vencidos desde o dia 21 de Março de 2000, data da citação, até integral pagamento.
E foi ainda julgada não verificada a litigância de má fé.
Dela recorreu a ré, formulando as seguintes conclusões: .....
A apelada não alegou.
Colhidos os vistos legais cumpre apreciar e decidir.
Em 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos: .....
O DIREITO.
Questões a decidir:
a) Eventual alteração da matéria de facto; b) Da caracterização do contrato celebrado entre A. e R.
c) A indemnização de clientela.
I.......
IIPara a caracterização do contrato parece-nos que devem ser tidos em consideração os seguintes factos que foram dados como provados: 4 - Em 24/09/91, "E...." e "V...." outorgaram um contrato: .......
b) em que «a "E...." obriga-se a fornecer ao cliente, e este obriga-se a adquirir em exclusivo à "E...", os combustíveis e os lubrificantes (…) vendidos ao cliente, quer directamente pela "E...", quer por quem esta indicar para o efeito, aos preços oficiais em vigor, ou, na sua falta, aos preços de mercado que constam das tabelas aprovadas pela "E..." (…) e que são vendidos ao público sob as marcas ou denominações "E..."» (cláusula 2.ª), c) em que o "cliente tem direito a 80% (oitenta por cento) das comissões de revenda fixadas oficialmente", nestas se considerando "incluída a comissão referida no parágrafo 2 do art.º 269.º do Código Comercial", com " as restantes condições comerciais como, por exemplo, preços de venda ao público e condições de pagamento, são as constantes do Anexo 1 e podem ser modificadas pela "E...", devido a condições do mercado, alterações de custos, como consequência de decisões de organismos oficiais, etc." (cláusula 5.ª), d) em que «a "E..." obriga-se a instalar no estabelecimento, uma vez obtidas as necessárias autorizações por parte das entidades oficiais, se for o caso, os materiais e equipamentos de que conserva propriedade, constante da relação Anexa (Anexo III), sendo obrigação do cliente, em relação a esses materiais e equipamentos, «mantê-los em perfeito estado de funcionamento, avisar imediatamente a "E..." de qualquer avaria ou deficiência neles verificados, não utilizar para fins distintos daqueles que se destinam, não alterar o local em que se encontram nem o seu aspecto, assumir plena responsabilidade pelos danos neles causados por terceiros, cabendo-lhe exigir do causador as indemnizações a que tiverem direito, restituí-los à "E..." logo que cesse o presente contrato qualquer que seja a causa ou motivo", sendo que «"a E...." apenas será responsável pelos custos de reparação, substituição, verificação, afinação e beneficiação, decorrentes de defeitos de construção ou de instalação dos materiais de equipamento atrás referidos» (cláusula 6.ª).
e) em que «o funcionamento do estabelecimento e sua exploração são da exclusiva conta e risco do cliente, que será o único responsável por qualquer acidente ou dano causado pelas instalações, produtos ou material nele existentes, bem como pelo cumprimento das obrigações assumidas pelas pessoas com que contrata" e em que "os custos de exploração, manutenção e reparação do estabelecimento, incluindo os seus equipamentos, são da responsabilidade do cliente, competindo à "E..." promover a adjudicação e fiscalização dos trabalhos e equipamentos necessários, sendo outrossim da "de responsabilidade da "E..." os custos de grandes reparações e substituições necessárias devido ao uso e degradação normal do estabelecimento (cláusula 8.º), j) que, prevendo uma entrada em vigor na data da sua assinatura e o período de duração de um ano a contar da data de abertura do posto de abastecimento, era renovável automaticamente por iguais períodos, se nenhuma das partes o denunciasse com pelo menos 180 dias de antecedência do seu termo, por carta registada com aviso de recepção(cláusula 15.ª), l) em que, "cessada a vigência deste contrato, qualquer que seja a causa ou o motivo, o cliente obriga-se de imediato a: a)liquidar integralmente à "E..." todas as importância sem dívida ou ainda não pagas, b)libertar o estabelecimento e entregá-lo com todo o material, equipamentos e instalações em boas condições de funcionamento, pagando todos os que estiverem em falta ou danificados, aos preços que tiverem na altura" (cláusula 16.ª), 6- Em 24 de Setembro de 1991, a "E..."., por escritura de compra e venda outorgada no 2º Cartório Notarial de L..., de fls. 32 a fls. 34º do Livro nº 38-F, adquiriu a J... e mulher, livre de quaisquer ónus ou encargos, o prédio misto, composto de edifício destinado a estação de serviço, oficina de reparação de ....
11- As obras e instalação de equipamentos por referência ao acordo celebrado em 24/09/91 ficaram concluídas em 31/03/96.
12 - A A. iniciou a exploração do posto de abastecimento de combustíveis.
13 - No âmbito da exploração de abastecimento referido nos autos, a Autora contratou trabalhadores por referência à exploração daquele posto.
14 - Recebeu a Autora pela venda de combustíveis da Ré e antes dela pela "E..." postos de Abastecimento quantias referentes à venda de combustíveis.
15 - Entre 01.04.96 e 12.12 96 a Autora recebeu da "E:::" a quantia total de 2.053.562$00 relativa à venda de combustíveis e lubrificantes.
16 - De 1/1/97 a 31/12/97, recebeu, a esse mesmo título, daquela" E..." e da Ré, a quantia total de 4.189.290$00.
17 - De 1/1/98 a 31/12/98, recebeu, da Ré, àquele mesmo título, o total de 4.412.087$00.
18 - De 01.01.99 a 31.03.99 recebeu a Autora da Ré a quantia de 1.078.617$00 a esse mesmo título.
22 - Naquela data, a Ré recebeu, da A., aquele posto de abastecimento, com todos os respectivos factores produtivos organizados e aptos a funcionar em termos de gerar lucros.
30 - Com vista a preparar o posto para o seu normal funcionamento, a A. divulgou, na região onde o mesmo se situa, a notícia relativa à sua abertura.
34 - Deu ordens, dirigiu e fiscalizou os trabalhadores afectos à exploração do posto de combustível.
35 - Explorou, no prédio onde está instalado o posto de abastecimento, uma boutique e um snack bar.
36 - Vendeu, aí, entre outros, os seguintes produtos: lubrificantes, café, chocolates, bolos, cervejas, águas e refrigerantes.
37 - Encomendou os produtos vendidos quer no posto de abastecimento, quer na boutique e no snack bar.
38 - Pagou esses produtos.
39 - Pagou todas as despesas inerentes ao funcionamento do posto de abastecimento, da boutique e do snack-bar...
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