Acórdão nº 0450157 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Fevereiro de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2004
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto Salvador ...................

, intentou em 26.6.2000, pelos Juízos Cíveis da Comarca do ......... - actualmente .. Vara Cível - acção declarativa de condenação com processo sumário, contra: Maria .................

Pedindo que seja declarada a nulidade do contrato-promessa de compra e venda de uma fracção autónoma, entre ambos celebrado, e a Ré condenada a restituir-lhe a quantia de € 8.978,36 (1.800.000$00) a título de devolução do sinal, acrescida de juros moratórios vencidos, os quais até 26/6/2000 ascendem a € 489,01 (98.038$00), e vincendos até integral pagamento: ou, subsidiariamente; - que seja o contrato-promessa declarado anulado, e a Ré condenada a restituir ao Autor a quantia de € 8.978,36 (1.800.000$00), a título de devolução do sinal, acrescida de juros moratórios vencidos, que até 26/6/2000 ascendem a € 489,01 (98.038$00), e vincendos até integral pagamento.

Para o efeito e, em síntese, alegou o Autor que, em 14 de Setembro de 1999, celebrou com a Ré um contrato-promessa de compra e venda que teve por objecto uma fracção autónoma designada pela letra "B", correspondente ao ..andar, com entrada pelo nº... do prédio sito na Rua ............ nºs. ... a ... no ........... No âmbito desse contrato o Autor entregou à Ré a quantia de € 8.978,36 (1.800.000$00), como sinal e princípio de pagamento do preço.

Acontece que as assinaturas apostas nesse contrato não foram reconhecidas, presencialmente pelo notário, nem a existência da respectiva licença de utilização ou de construção foi certificada notarialmente, pelo que tal contrato é nulo, devendo a Ré restituir o sinal que lhe entregou o Autor, conforme art. 289º do Código Civil.

Acresce ainda que a empresa de mediação imobiliária que promoveu a venda da dita fracção anunciou-a, designadamente, dizendo ao Autor que da dita fracção fazia parte um sótão.

E, veio a Ré a dizer-lhe, aquando da 1ª e única visita à fracção pelo Autor, que o uso do sótão existente no prédio era reservado ao proprietário (ou ocupante) dessa mesma fracção. Na verdade à vista e no local, o referido sótão parecia, de facto, pertencer à dita fracção, já que a entrada directa e exclusiva para a mesma se fazia por uma parte no "hall" de entrada da fracção.

O Autor entregou desde logo, ali, o referido sinal.

Algum tempo depois, veio a saber que o sótão não fazia parte da fracção nem está afecto ao uso exclusivo da mesma, pois é parte comum do prédio em que está inserido, podendo ser usado por todos os condóminos.

O Autor foi induzido em erro pela Ré e pelo seu pai, erro esse que o levou a assinar o referido contrato-promessa, pelo que o contrato celebrado é também anulável, tanto mais que a Ré e seu pai usaram de dolo para determinar a sua vontade.

Contestou a Ré, impugnando a versão dos factos apresentada pelo Autor, designadamente, dizendo que foi este que prescindiu das exigências de forma, previstas no art. 410º do Cód. Civil, pelo que não as pode agora invocar, manifestando, assim uma manifesta violação do princípio da boa fé.

Impugnou, igualmente, que alguma vez tivesse sido dito ao Autor que o sótão fosse reservado ao proprietário da fracção prometida vender, tendo ele sido devidamente informado que tal sótão era comum aos dois condóminos.

Concluiu pela improcedência da acção e consequentemente pela sua absolvição dos pedidos.

Respondeu o Autor, concluindo como na petição inicial.

*** Foi proferido despacho saneador e seleccionada a matéria de facto assente e a que constitui a base instrutória.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, tendo-se respondido às questões da base instrutória, conforme despacho de fls. 258 a 259 vº.

*** A final foi a acção julgada totalmente improcedente e absolvida a Ré do pedido.

*** Inconformado recorreu o Autor, que, alegando, formulou as seguintes conclusões: 1ª A sentença recorrida carece de qualquer fundamento legal.

  1. O contrato-promessa ajuizado nos presentes autos não cumpriu as exigências de forma previstas no artigo 410°, n°3, do Código Civil.

  2. Assim, esse contrato é nulo por falta de forma, nos termos do artigo 220° do Código Civil, seguindo a melhor doutrina.

  3. Mesmo que se entenda que a sanção prevista seja a anulabilidade, é sempre o recorrente quem tem legitimidade para invocar esta nulidade.

  4. Esta falta de forma não foi causada pelo recorrente, e muito menos, culposamente causada pelo recorrente.

  5. As formalidades previstas no artigo 410°, n°3, do Código Civil, destinam-se a proteger a parte mais fraca nos contratos-promessa, o promitente-comprador, aqui recorrente, por forma a que o conteúdo dos contratos seja devidamente ponderado, antes de assinado, o que não aconteceu, pois o recorrente não dispôs dessa oportunidade.

  6. Não agiu o recorrente com abuso do direito, ao invocar a nulidade do contrato-promessa por falta de forma legal, não se aplicando aqui o artigo 334° do Código Civil.

  7. Assim, deve a ré recorrida ser condenada a restituir o sinal de 1.800.000$00 ao autor recorrente, acrescido de juros, nos termos do artigo 1269° e seguintes do Código Civil.

  8. Mesmo que o contrato-promessa fosse válido, o que não acontece, a recorrida nunca poderia obrigar o recorrente a celebrar o contrato definitivo com alguém que não ela própria.

  9. Ora, a fracção em causa esteve - no período que interessa aos autos - registada a favor de pessoa diferente da ré recorrida, sem que estivesse prevista qualquer cláusula de pessoa a nomear e sem que qualquer nomeação tivesse, mesmo assim, sido feita.

  10. Pois, a escritura definitiva de compra e venda só poderia ser celebrada com o proprietário, a favor de quem o imóvel estava inscrito no registo predial.

  11. Assim, o recorrente poderia sempre recusar-se a celebrar essa escritura, sendo a recorrida sempre obrigada a devolver ao recorrente o sinal recebido.

  12. Não se pronunciou a sentença recorrida sobre este aspecto da causa, quando o devia ter feito, nos termos do artigo 660° do Código de Processo Civil, sendo, por isso nula, nos termos do artigo 668°, n° 1, alínea d), do Código de Processo Civil.

  13. Violou a sentença recorrida os artigos 410°, n°3, e 334° do Código Civil e o artigo 660° do Código de Processo Civil.

  14. Deve assim, a sentença recorrida ser substituída por outra em que a recorrida seja condenada no pedido constante da petição inicial, sendo em consequência o contrato-promessa declarado nulo e a ré recorrida condenada a devolver ao recorrente a quantia de 1.800.000$00 (equivalente a € 8.978,36), acrescidos de juros à taxa legal, desde 14 de Setembro de 1999, até integral pagamento.

    Nestes termos, e nos mais de Direito aplicáveis, deve o presente recurso ser julgado procedente, sendo a recorrida condenada no pedido constante da petição inicial, com as legais consequências, o que se fará por obediência à lei, assim se fazendo inteira Justiça.

    Não houve contra-alegações.

    Foram colhidos os vistos legais.

    *** Foi a seguinte a matéria de facto considerada provada: A) - O Autor pretendeu, durante o Verão de 1999, comprar um andar para habitação.

    1. - Nessa sequência veio a ser celebrado entre o Autor e a Ré, em 14 de Setembro de 1999 um contrato, denominado de "promessa de compra e venda" em que esta prometeu vender àquele, o qual promete comprar, pelo preço de 26.500.000$00, a fracção autónoma designada pela letra "B", correspondente ao .. andar, com entrada pelo nº... do prédio urbano sito na Rua .............., nºs ... a ..., da freguesia de .............. desta cidade do ........., inscrito na respectiva matriz no art. 5723 e descrito na .. Conservatória do Registo Predial do ..........., sob o nº6164, a fls. 165 do Livro B.17 (cfr. doc. de fls. 11).

    2. - Consta ainda nesse contrato que naquela mesma data de 14.09.1999, como sinal e princípio de pagamento o Autor entregou a quantia de 1.800.000$00, sendo a restante quantia em dívida, 24.700.000$00, liquidados no acto da escritura, não ultrapassando os 60 dias além daquela data.

    3. - Nesse contrato encontram-se apostas as assinaturas da Ré e do Autor.

    4. - A aquisição da referida fracção encontrava-se, ao tempo da celebração do mencionado contrato-promessa registada a favor de João ............ (certidão de fls. 12 a 16).

    5. - O documento junto a fls. 11 não contém o reconhecimento presencial das assinaturas aí apostas, nem a certificação pelo notário da existência da licença respectiva de utilização ou de construção.

    6. - O sótão parecia, à vista e no local, pertencer, de facto, à fracção, pois a entrada directa e exclusiva para o mesmo fazia-se por uma porta do "hall" de entrada da fracção.

    7. - A entrada directa e exclusiva para o sótão acontecia já dentro da própria fracção.

    8. - E, foi logo nessa primeira e única visita que o pai da Ré disse ao Autor que já existia outra pessoa interessada em adquirir a fracção.

    9. - E, ainda nas palavras do pai da Ré, provavelmente nesse mesmo dia 14 de Setembro de 1999, à...

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