Acórdão nº 736/03.4TOPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Julho de 2010

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução07 de Julho de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC. PENAL Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE.

Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO.

Área Temática: .

Sumário: I – Aberta a audiência de julgamento, as nulidades e quaisquer outras questões prévias ou incidentais susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa, acerca das quais não tenha ainda havido decisão e que o tribunal possa desde logo apreciar, são conhecidas e decididas antes das exposições introdutórias, como decorre da articulação dos arts. 338 nº 1 e 339, nº 1 ambos do CPP.

II – O disposto no art. 338, nº 1, do CPP não impõe que, antes da produção de prova em julgamento, o tribunal aprecie nulidades relativas a meios de obtenção de provas ou nulidades relativas às provas através daqueles meios obtidas (as quais se relacionam com o fim último da prova dos factos que são objecto do julgamento e, consequentemente, que são objecto da discussão da causa).

III – No art. 338, nº 1, do CPP (tal como já sucedida com o corpo do art. 424 do CPP de 1929) as nulidades de que o tribunal conhece e decide (susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa acerca das quais não tenha ainda havido decisão e que possa desde logo apreciar) são nulidades processuais (sejam de conhecimento oficioso ou tenham sido deduzidas pelos respectivos interessados), as quais não se confundem com as nulidades que significam proibições de provas (art. 118, nº 3, do CPP).

IV – Havendo provas proibidas, por terem sido ilegalmente obtidas, as mesmas (independentemente da sua importância) não podem ser utilizadas no processo, v.g.

para condenar o arguido; mas isso não significa que, por exemplo, as provas proibidas tenham que ser desentranhadas dos autos (v.g. para não influenciarem o tribunal ou os sujeitos processuais).

V – O despacho proferido na fase inicial da audiência de julgamento que relega, para o acórdão, o conhecimento de nulidades das escutas, da recolha de imagens e das buscas deduzidas por alguns arguidos quer no início da audiência, quer em contestação (em que, portanto, o tribunal não toma posição imediata sobre essas questões prévias colocadas), não viola o disposto no art. 338, nº 1, do CPP, nem esta norma impõe uma decisão sobre aquelas questões colocadas, tanto mais que a mesma (ainda que totalmente favorável aos arguidos) não obstava à apreciação do mérito da causa.

VI – Enquanto as provas em causa (recolhidas através de escutas telefónicas, de recolha de imagens e de buscas) não forem declaradas proibidas, podem ser objecto de discussão em julgamento, na fase de produção de prova, por todos os sujeitos processuais, que assim podem realçar aqueles aspectos ou pontos que, no seu entender, demonstravam que, por exemplo, haviam sido ilegalmente obtidas.

VII – Não é pelo facto de existir essa discussão em julgamento (na fase de produção de prova), que o tribunal fica dispensado de, no acórdão, apreciar a legalidade das provas que foram indicadas e produzidas v.g.

pela acusação (ou no despacho de pronúncia nos termos do art. 308, nº 2, do CPP) e pela defesa (na contestação); as nulidades relacionadas com proibições de prova são de conhecimento oficioso, devendo ser apreciadas pelo tribunal do julgamento até à decisão final (o que significa que também podem ser conhecidas e apreciadas antes de ser proferida decisão final).

VIII – Incumbindo ao tribunal controlar a legalidade das provas (art. 340, nº 3, do CPP), o facto de num primeiro momento (eventualmente pela complexidade das questões suscitadas) não ter conhecido das invocadas proibições de prova (e, portanto, mesmo aceitando que, logo no início do julgamento, através de despacho ditado para a acta, pudesse conhecer daquelas questões prévias suscitadas pelos arguidos), não significa que ficasse desonerado de, mais tarde (como veio a suceder no acórdão sob recurso, no momento a que se refere o art. 368, nº 1, do CPP, onde as tratou como “questões prévias”) as apreciar, declarando nulas todas ou parte das provas produzidas e discutidas na fase de julgamento (a decisão sobre nulidades de provas está relacionada com a fundamentação de facto da decisão final, nunca podendo ser utilizadas as consideradas proibidas).

IX – Essa decisão de relegar para o acórdão o conhecimento das nulidades arguidas relativas a escutas telefónicas, recolha de imagens e buscas era indiferente para a estratégia de defesa e para a decisão sobre o exercício do direito ao silêncio, tanto mais que sempre eram autónomos os diferentes meios de prova em questão (essas provas arguidas de nulas eram independentes v.g. de eventual prova resultante de declarações que os arguidos quisessem prestar em julgamento).

X – Não há omissão de pronúncia quando o tribunal, perante a questão que lhe é colocada, decide relegar o seu conhecimento para o momento do acórdão.

XI – O despacho proferido, relativo a comunicação de alteração de factos, não é uma sentença (nem a ela pode ser equiparado), razão pela qual não se aplica o disposto nos arts. 374 nº 2 e 379 nº 1 do CPP; por isso, a existir a alegada falta de fundamentação (considerando-se aquele despacho como decisório - apesar da comunicação efectuada traduzir uma “convicção provisória” que ainda poderia ser alterada - e, como tal, carecido de fundamentação por força do disposto no art. 97, nº 1-b) e nº 3 do CPP), verificava-se tão só uma irregularidade (arts. 118, nº 1 e 2 e 123 do CPP), que deveria ter sido arguida no próprio acto a que o interessado assistiu, antes desse acto ter terminado (art. 123, nº 1, do CPP), sempre perante a 1ª instância, sob pena de ficar sanada.

XII – No despacho proferido ao abrigo do disposto nos arts. 358 ou 359 do CPP não se comunicam conclusões mas antes factos concretos (sendo as conclusões extraídas mais tarde, no momento em que o tribunal procede à subsunção dos factos ao direito no acórdão que vai proferir no processo).

XIII – O disposto no art. 340, nº 4, do CPP, confere ao Tribunal (e não aos sujeitos processuais) o poder de controlar, sindicar e, se for o caso, indeferir (fundamentadamente) provas oferecidas pela defesa na sequência de comunicação de alteração de factos efectuada.

XIV – Não se pode afirmar que é discricionária ou inquisitória a decisão do Tribunal quando indefere diligências probatórias, apresentadas na sequência de comunicação de alteração de factos, uma vez que sempre existe a possibilidade de controlo daquela decisão pelo Tribunal Superior, desde que seja interposto o competente recurso.

XV – A decisão proferida, ao abrigo do disposto no art. 107, nº 6, do CPP, sobre pedido de prorrogação de prazo para recorrer de acórdão em processo que se revela de excepcional complexidade (não sendo decisão que ordena acto “dependente da livre resolução do tribunal” - cf. art. 400, nº 1-b), do CPP) é passível de recurso, nos termos gerais, por quem tenha legitimidade e interesse em agir (ver arts. 399 e 401, nºs 1 e 2 do CPP).

XVI – As alterações introduzidas pela Lei nº 48/2007, de 29/8, mormente ao disposto nos arts. 107, nº 6 e 411 do CPP, traduzem uma opção deliberada do legislador no sentido de admitir a possibilidade de prorrogação de prazo previsto nos nº 1 e 3 do art. 411 do CPP, em procedimentos que se revelem de excepcional complexidade (havendo prorrogação, o prazo de interposição de recurso pode, em abstracto, chegar ao máximo de 20 + 30 = 50 dias), o que não exclui as situações em que o recurso tem igualmente por objecto a reapreciação da prova gravada (neste último caso, o que sucede é que o prazo de 20 dias previsto nos nºs 1 e 3 do art. 411 do CPP – independentemente do procedimento se revelar de excepcional complexidade e poder ser prorrogado até ao limite máximo de 30 dias – é sempre elevado para 30 dias).

XVII – A particularização dos nºs 1 e 3 do art. 411 do CPP, na alteração introduzida ao art. 107, nº 6, do CPP, significa que é o prazo de 20 dias para interposição de recurso que pode ser prorrogado. Para este efeito, o prazo aludido no nº 4 do art. 411 do CPP (onde o legislador eleva o prazo geral de 20 dias para 30 dias precisamente pelo maior grau dificuldade na interposição de recurso que tiver por objecto a reapreciação da prova gravada) não é um novo prazo de recurso, mas antes o mesmo prazo de 20 dias aludido nos seus nºs 1 e 3 (para o qual remete expressamente), acrescido de mais 10 dias (o que dá a referida elevação para 30 dias = 20 + 10 quando o recurso verse sobre a reapreciação da prova gravada).

XVIII – Não é pelo facto de ser admissível a prorrogação do prazo de qualquer dos actos tipificados no art. 107, nº 6, do CPP, que o requerente passa a ter automaticamente direito ao seu prolongamento máximo (até ao limite de 30 dias): tudo antes dependerá do juízo de ponderação que for feito, considerando o acto que pretende praticar e o grau de dificuldade ou complexidade do concreto processo em causa, o que pressupõe igualmente a análise do que foi alegado em concreto – e não de forma abstracta – pelo sujeito processual que requereu a prorrogação do prazo.

XIX – O disposto no art. 328, nº 6, do CPP, bem como jurisprudência fixada no ac. do STJ nº 11/2008, in DR I-A de 11/12/2008, aplica-se à fase da audiência e da produção da prova em julgamento e não à fase subsequente da sentença, a qual se inicia com a deliberação após o encerramento da discussão da causa.

XX – O encerramento da discussão da causa (que sempre acontece nos termos do art. 361, nº 2, do CPP) é o momento essencial para distinguir a fase da audiência e a fase da sentença (tanto mais que encerrada a discussão se segue a deliberação, momento este já inserido na fase da sentença e que, portanto, não está aberta à discussão dos sujeitos processuais, nem ao contraditório), sendo precisamente porque foi encerrada a discussão que, em caso por exemplo de necessidade de produção de novos meios de prova, se impõe a reabertura da audiência (reabertura que logicamente supõe o anterior encerramento) e a posterior repetição dos procedimentos aludidos nos arts. 360 e 361 do CPP.

XXI – A...

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